
Mais uma notícia dessas que não se consegue entender como o comportamento humano pode consumar um ato insano e só compreensível pela psiquiatria, se é que compreende. Têm sido rotineiras notícias da prática de estupros e importunação sexual contra mulheres de todas as camadas sociais e econômicas. Poucas ganham manchetes e vêm a público, mas é muito mais do que se imagina. Os casos mais marcantes, nos últimos tempos, têm como autores o Dr. Roger Abdelmassih, hoje com 74 anos, condenado a 181 anos de cadeia, pela prática de estupro em 37 mulheres.
Agora, noticiam- -se as práticas de João de Deus, o médium que prometia curas e soluções para todos os casos, inclusive reconciliações de casais em crise conjugal. Já identificaram dezenas de vítimas, em vários estados, inclusive do Exterior. Hoje com 76 anos, vêm à tona seus crimes, inclusive o abuso de sua filha quando ela contava com 10 anos de idade. Entre as funções da pena privativa de liberdade, estão a intimidação e a prevenção para que o delinquente não reincida. Nesses crimes, praticados contra mulheres, nessas circunstâncias, a pena não cumpre mais as suas finalidades porque são noticiados os crimes muitos anos depois, com processos que se arrastam por décadas e quando chega a hora de cumprir a pena, o condenado está com 74 ou 76 anos de idade, doente, em final de vida e acaba cumprindo em prisão domiciliar, quando cumpre. Não cumpre, portanto, a pena que lhe foi imposta.
Tramita na Câmara Federal projeto de lei que pretende a castração química para os autores desses crimes que teriam, pela castração, diminuídas a libido e o apetite sexual. Mais uma lei inócua. De que valerá castrar alguém com 76, ou mais anos de idade, depois que já perpetuou centenas de crimes contra a liberdade sexual. O que precisa mudar é a cultura do estupro, cujo medo de noticiar é a regra. As mulheres precisam ter instrumentos que lhes garantam a segurança que ninguém vai importuná-las sob pena de responsabilização imediata. Precisam entender que a fé opera milagres, para todos os credos, mas não há homens com poder para resolver todas as questões terrenas ou celestiais, especialmente em troca de favores sexuais. Só haverá solução para esses casos, quando a mulher, sem represálias e sem constrangimentos, tiver coragem e condições, inclusive com orientação psicológica, para denunciar imediatamente o ocorrido, inclusive quando ocorrer a primeira vez. Passados alguns, ou muitos anos, a impunidade se operará. Não se diga que ninguém acreditará na versão exclusiva da vítima.
Se for uma versão coerente, sólida e convincente, bastará como prova. Não se exige e não há testemunhas ou vestígios para esses crimes praticados na clandestinidade e a jurisprudência tem consagrado esse entendimento. Basta que a versão seja coerente com as circunstâncias e o acusado não apresente álibi razoável. Não sendo assim, vamos, de tempo em tempo, ouvir essas notícias de crimes sem punição exemplar.